A melancolia na poesia de Eduardo Pondal

 

 

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For shade to shade
will come too drowsily

Drown the wakeful
anguish of the soul


               John Keats




     A leitura da obra poética de Eduardo Pondal, especialmente Queixumes do pinos, permite-nos observar que um fundo sentimento de melancolia tinge os seus versos com acentos achegados umhas vezes a umha intensa dor, outras a um vago e delicado matiz de nostálgia.
     A melancolia, como tal conceito, pode interpretar-se na vulgar indefiniçom do ponto de vista popular, —como sentimento de vaga nostalgia ou tristeza
—, na sua acepcom freudiana —referente à perda de um ser amado ou de umha abstraçom equivalente: a pátria, a liberdade, o ideal (1)—, e desde um ponto de vista literário como projecçom do "eu" poético, na sua relaçom com a saudade, e como dimensom mítica ao serviço de umha funçom caracterizadora.
     Ricardo Landeira califica a melancolia pondaliá como umha variante da saudade caracterizadora da poesia galega do XIX, sentimento vago e indeterminado ou indefinível que nom sabe identificar e que produz no home angústia perante o seu destino. O poeta teria entom duas possibilidades salvadoras: umha, a possibilidade salvadora do pretérito, dado que a memória do vivido, ao se poetizar e se remoçar, consola o home e defende-o da incerteza do seu destino. A outra alternativa é situar-se no futuro ideal que se pressente pola ánsia mesma, e que tem de ser algo ideal, já que de nom ser assim nom poderá encher essa ánsia infinita. Pondal move-se do passado ao futuro suspirando ou polas cousas que fôrom ou polas que serám (2).

     Com anterioridade, José Luís Varela tinha afirmado que o "soliloquio melancólico del bardo" ascenderia às fontes ossiánicas, o mesmo que o tom elegíaco, o lírico e a inovaçom (3).

     A traslaçom que Pondal realiza do bardismo de Macpherson cara o contexto histórico-político do povo galego —e que nom oferece dúvidas já nos nossos dias— justifica que nom seja a obra do poeta bergantinhám um calco da do escocês. Polo contrário, atingirá uns graus de originalidade bem singulares.
     Assim, nom é que a melancolia provenha do bardo macphersoniano, mas que o contexto esquivo da realidade presente (bem concreta e, se calhar, definida) provoca no bardo pondaliám o sentimento melancólico.
     Ora bem, as origems da melancolia (fontes e canles transmissoras) podem ser mui diversas, sem que por isso tenham nada a ver com a saudade dos poetas do XIX galego, tendo em conta o tratamento que este tema recebeu nas últimas décadas.
     Pola via da hipótese, poderia-se mesmo aventurar umha tendência do sujeito poético à melancolia, entendida do ponto de vista psíquico como tristeza vaga, profunda e permanente, nascida de causas físicas ou morais.
     Por outro lado, a melancolia seria a cadência espiritual de um poeta dotado de consciência superior e carregado de responsabilidade moral, e que, como tem apontado o profesor Carvalho Calero, recorda o Moisés de Vigny ou o poeta de Baudelaire (4). Portanto, deveria ser analisada sob o fundo ideológico, o carácter patriótico e o compromiso cívico que dam sentido à obra de Pondal.



A dor de ser imcomprendido

     Contraponto entre o ideal sonhado nom satisfeito e a vulgar matéria que o poeta despreza, a melancolia pondaliá amostra-se como umha dor insuportável. Carvalho Calero tinha assinalado ser esta melancolia produzida polo sofrimento do poeta com quem o povo escuro é ingrato (5). Tal sofrimento é o preço da sua superioridade moral e da responsabilidade que tem com aquela. Como ser elegido, quer erguer o destino do seu povo e, ante o fracasso, um sentimento profundo de frustraçom embarga o seu ánimo, pois o seu povo, inconsciente de nengum destino glorioso, está entregado a trabalhos servos e inobres, escravo da vulgar matéria.
     O poeta nom pode escusar um gesto de ira profunda, digno de quem possui a superioridade moral e a certeza de estar marcado por um desígnio profético:
    

"Raza escura galáica
De rústicos instintos;

Que injusta sacrificas,

Os teus millores fillos;

Madrasta desleirada,

De desígnios cativos;

Progénie ignava e inculta,

Q'aborréces teus ínclitos;

Da polvorosa gleba,

Pobo tan so engreido;

E ás cousas incrinado,

Dos escuros sentidos;
Ay de ti, dura raza,
De proceder esquivo;
Ay de ti, que así tratas,
Teus profetas divinos...!
A quen tí, nécia, debes,
Sair d'oscuro olvido,
Dura raza, senon á estes videntes,
Nobres e peregrinos?" (6)

     A icompreensom e o desprezo inclinam-no à procura da soidade e do olvido. O bardo passa polo seu tempo ignoto e obcurecido, desprezado polos seus:
"Cegos non se decatan
Na súa rica estólida
¿Non ven na miña frente
Formidables lóstregos de gloria?" (7)


     Fracassado na sua missom espiritual, só como os seus nobres pensamentos, o postergado buscará refúgio na soidade desolada que lhe é afim espiritualmente, na que procurará abeiro para o seu sofrimento:

"O bardo solitario e vagoroso,
No noso siglo rudo, hé parecido

Ao carballo dos celtas quexumbroso,

Po-los ventos da gandra combatido:

Tal hé d'un povo rudo e desdeñoso,

O bardo solitario desvalido;

Vive entre trexas hirtas e avarentas,

A soas cos seus nobres pensamentos."

                    (Novos poemas, p. 47)


     Invadido pola melancolia no seu desamparo, o bardo aparece caracterizado psicologicamente como errabundo, vago e enigmático, diferente ao resto dos mortais, identificado com o obscuro:

"Geroglífico ousado
Do limo soñador,
Vou, e ignoto á min mismo
Escuro enígma eu son;"

                    (Queixumes..., p. 18)


     Mesmo a sua caraterizaçom física evidéncia esse tormento moral sofrido polo poeta:

"Que barba non cuidada!
Que pálida color!
Que vestido que longa
Noncuranza afeóu!"
                    (Queixumes..., p. 17)


     identificado com as forças poderosas da Natureza:

"Parece un pino leixado do vento,
Parece botado do mar de Niñóns."
                    (Queixumes..., p. 17)


     Estas formas elementares com as que o bardo é identificado som comuns na obra de Pondal e relacionam-se com o sentimento melancólico. Mas neste poema tenhem certo matiz tremendista, pois o pinheiro leixado do vento apresenta conotaçons de dor física ou abandono e "botado do mar de Niñóns" remet-nos a um fondo bíblico, cujos seres tenhem algo de aparência sobre-humana.




O paso do tempo e o sonho do passado

     Ricardo Landeira tem afirmado, como já apontámos, que, postergado o bardo por um presente que nom o aceita, procurará a possibilidade salvadora num pretérito que console o home e o defenda da incerteza e da angústia do seu destino (8). Ignoto para si mesmo e para os seus, solitário e errabundo, o bardo reconhecerá-se num passado lembrado em todo o seu esplandor.

     Assim, na evocacóm de Toimil no poema "En turbia noche de inverno":

"-" 'Splendor dos pasados tempos,
Cal receoso estrelar,
Dos vagos días que fóno,
E que já non volverán:
Da miña escura memoria,
Ven á brétoma alumbra."
                    (Queixumes..., p. 75)


     Porque nesse pretérito o poeta procura com melancolia umha época feliz, face a umha obscura idade de ferro na que toda possibilidade de sonho e ideal é negada:

"Cautivo do barro,
Con fonda tristura,
Dixérase o bardo,
Que soña antr'as uces,
Co tempo pasado,
Que fora tan libre,
Fugindo do trato,
Falaz, inseguro,
Dos necios humanos!"
                    (Queixumes..., pp. 15-16)


     A procura dese pretérito ideal leva o poeta ao encontro com as paisagens nativas e ao recordo da infáncia. Reconhece com nostalgia os lugares e os objectos amados que evocam um tempo feliz:

   "Castaños de Dormeá,
Os de corpo ben comprido,
De graciosa estatura,
Dobrados e ben seguidos:
               (...)
   Cuando juntos nos criámos,
era outro tempo, e o recinto
Da vosa inda curta sombra,
N'era grande; que meniño
Daba eu tanta coma vos,
No doce prado nativo.
   Por fin, na nosa velléz,
Despois do bó tempo ido,
Juntos volvémos a vérnos;
Mais con diferente destino."
                    (Queixumes..., pp. 95-96


     Mas o enfrentamento com os eidos nativos será tamém motivo de tristeza e melancolia, pois o bardo já nom é o mesmo. Os galhos secos ou cobertos de musgo som testemunhas de um tempo que passou e que nom poderá voltar. Assim é evocado de forma insistente no último verso de cada estrofe no poema "Carballos de Carballido":

   "Carballos de Carballido,
Cand'era rapaz deixéivos;
Vin despois de muitos anos;
        Já vámos vellos.
   Pasáronse as alegrías,
Que troguéra o tempo ledo;
A mocedá fui pasada;
        Já vamos vellos.
                    (Queixumes..., p. 143)


     Se as árvores podem reverdecer com a nova primaveira, porém todo regreso a um pretérito ideal será impossível para o poeta. Fica só a possibilidade do recordo melancólico. O passo do tempo, os recordos de algumha pátria perdida, vam sempre com ele:

"N'hé a vellez a que causa
O fondo dolor que sinto;
Pois que son do tempo voso,
Carballos de Carballido:
Suidades de non sei qué,
Recordos quezáis do espírito,
D'algunha perdida pátria,
Ou d'antigo ben perdido,
N'esta peregrinación
Miña, van sempre comigo;"
                    (Queixumes..., pp. 35-36)


     A melancolia fere-o produndamente e qualquer regresso será triste e doloroso. Demudado o seu rosto, exclamará de forma desgarrada ante os seus eidos nativos que nom o conhecem:

"—Val garrido, val garrido
o da miña criazón;
¡oh! val, xa non me conosces,
¿tan mudado, ¡ouh, val!, estóu?
Certo, tí eres o mesmo,
mais eu o mesmo non son." (9)


     Tamém no poema "Arentar", a ponte, o rio, as gestas, tudo é o mesmo prédio do tempo que passou. Qual o cabo que, combatido por tormentas e furacáns, "jaz sombrio e demudado", tamém a alma do bardo está demudada por sofrimentos e o desprezo, tragédia íntima do possuidor de um elevado sentido da existência e da História. Qual o vello pinheiral de Froxám, no que sob as pólas cobertas de musgo, repousam os antepasados, cujos sepulcros alumea um branco luar:

"Da pasada mocedade,
Can diferente ora estás...
Os verdes anos primeiros,
Fogem como ó vento soán,
Do essquivo cabo Nariga,
Antr'ó espeso matorral."
                    (Queixumes..., p. 76)




A contemplaçom significativa da paisagem

      A paisagem pondaliá é a paisagem nativa elegida espiritualmente polo poeta e dotada de um significado profundo e transcendente. Na obra de Eduardo Pondal nom hai descritivismo paisagista, senom que a mesma paisagem está fortemente simbolizada (10).
     Existe umha profunda relaçom fentre o visível e o invisível, quer dizer, entre a Natureza e o espírito do poeta, relaçom afectiva entre o contemplado nos seus elementos (árvores, aves, horas do dia, montes) e a realidade interior. E da contemplaçom nasce um sentimento que fornece a serenidade da beleza, mas tamém o cuitelo fero da melancolia.
     Os elementos da paisagem correspondem-se, pois, com estados espirituais. No poema "Feros corvos de Xallas" o esencial e profundo, vago e fero sentimento, identifica-se com os elementos signficados polo poeta:

"Algo de vago e fero,
Do meu ser no profundo
Eu levo, com'as brétomas
Dos curutos escuros;
E unha ruda e salvage
Incrinación dos seres vagamundos."
                    (Queixumes..., p. 27)


     O mesmo sentimento incerto e doloroso traspassa o ánimo de quen ouve o canto do maçarico:

"Ou mazarico que cantas,
Trás do pinal do Marico;
Non sei que me dá, se t'ouzo,
Non cantes máis, mazarico:

Cal fero cuitelo pasante e pungente,
Mesmo na alma te sinto!"
                    (Queixumes..., p. 36)


     Identificado com o vento, com os pinheiros, com os elementos da paisagem, sublinha-se o carácter errabundo do postergado que procura a soidade em lugares onde reina o olvido:

"Na tua soedá recebe,
Este bardo peregrino;
Ou valle das vagas brétomas,
E dos rumorosos pinos."
                    (Queixumes..., p. 36)


     No recordo do desprezo sofrido, da miséria do povo servo que posterga, voltará os olhos a umha Natureza na que quiger achar algumha mensagem. Frente a ela e de costas aos homes, o bardo é visitado pola melancolia na contemplaçom estática e silenciosa:

"Mentres os fillos dos celtas,
Cumpren serva e innobre vida;
Entonces o espírito invade do bardo,
Escura melancolía."
                    (Queixumes..., p. 89)


"mentras que os fillos dos homes
danse ás faenas da vida,
entonces do bardo a alma
visita a melancolía." (11)


     A geografia poética e vital que acolhe ao pensoso está determinada por lugares afastados do comum, nom freqüentados, nos que o silêncio só é interrompido polo canto áspero de algumha ave. Se nos remetemos aos poemas nos que o sentimento da melancolia aparece expresamente referido, o espaço geográfico é a marinha. O bardo contempla al pílharas voarem em gentil novelo ou recolherem-se nas furnas á hora do crepúsculo num ambiente de ensonhaçom que domina o cenário:

"Cando no escarpado cabo,
Sae a fror da caramiña,
O cazador anunciando,
A leda estación garrida;
Cando a doce Suévia,
Âs doces prayas amigas,
En nobelo gentil ajuntadas,
Chegan as ligeiras píllaras;
..."
                    (Queixumes..., p. 89)


A hora en q'a luz do luceiro,
sobr'o cabo loce tímida;
E á negra furna píando,
Recóllense as breves píllaras;
..."
                    (Queixumes..., p. 101)


   O comportamento do poeta nos textos recorda um óleo do romántico Gaspar David Friedrich, no que um monge aparece em estado de contemplaçom meditativa na beiramar, e tamém as chamadas "pinturas de costas" do pintor alemán, que guardam umha certa semelhança significativa com os versos de Eduardo Pondal. Som figuras humanas que, de costas ao espectador, a olhar para a Natureza, representam umha sorte de comunhom onde o divino se amostra na mesma Natureza. Tamém nos poemas referidos, o bardo que contempla as pílharas e sonha apoiado na sua harpa amostra a mesma actitude meditativa e sonhadora, suportada em dous símbolos esenciais: a harpa e o vento:

"Entonces dó bardo o espírito,
Que soña antr'as uces hirtas;
No formoso instrumento apoyado,
En donde o vento suspira;"
                    (Queixumes..., p. 89)

"Entonces do bardo a alma
que soña entre as uces irtas,
apoiado na sua arpa,
en donde o vento suspira;" (12)


     O mesmo sentido e valor com que aparece nos versos anteriores, onde a melancolia do bardo está deslocada cara o seu instrumento, recolhe-se de jeito fidelísimo em "A hora en que a luz do luceiro".

"Entonces ó triste bardo,
Que soña antr'as uces hirtas,
Na gentil arpa apoyado,
En donde o vento suspira;"
                    (Queixumes..., p. 101)


     Gentil e fermosa, a harpa é companheira na esquiva soidade que o bardo soía procurar na gándar e nas uces:

"El as gandras amaba e as irtas uces;
e soía escuitar,
apoiado na arpa compañeira,
o ruidoso compás
dos fillos da montaña que se queixan
con pracible fungar." (13)


     Quanto á memoria do passado, o vento está associado ao som da harpa. Ambos os dous evocam as glórias passadas dos filhos dos celtas, signos que perduram na memória do bardo e que seguem a fluir cara o presente. O seu canto fará despertar a consciência do povo galego:

"Batidas dos ventos,
Garridas e bellas
E ben engastoadas
Dos pinos pendentes,
Suspiran as arpas.
Están murmurando
Mil cousas pasadas.
¡Que dirán as copas
Do vento agitadas!
¡Que dirán suspenses
As mágicas arpas!
Non sólo murmuran
As cousas pasadas
Dos fillos dos celtas,
Mas tamén murmuran
As futuras ansias
As arpas garridas
E ben acordadas
Dos pinos da patria."
                    (Novos poemas, p. 43)


     É a evocaçom do passado na esperança do futuro. Se o galego despertar do seu letargo, a terra reverdecerá de novo. Qual outros símbolos de Pondal, o vento e a harpa tenhem um profundo significado político.




A hora do crepúsculo

     O crepúsculo é o momento do contraste entre a luz e a sombra, no que as formas se esvaem e ficam indeterminadas. Linha indefinida entre o sonho e a vigília, som-lhe próprios os estados do espírito relacionados com a melancolia, o sentimento do tempo, a soidade e a saudade do pasado, temas essenciais na obra de Eduardo Pondal, quem, a partir de umha experiência profunda e emotiva, os recria de forma original.

     Em "Campanas de Bastabales", as badaladas do crepúsculo ferem o ánimo do poeta como "cuitelo aguzado". Badaladas, canto do maçarico, o vento..., som elementos cuja contemplaçom provoca algum sentimento que o poeta nom pode apreijar. A procura do inexplicável achega-o aos eidos da melancolia:

"Cando é día e non é día,
cando se ve e non se ve,
cando reza aquel que cré,
e a nosa fantasía
finxe o que é e o que non é;
            (...)

e cando sentimental
o luceiro centellea,
e no craro do plinal,
diante do vento marzal
vai xemendo a rauda arcea;
            (...)
entonces teu triste son,
cheo de cristiano celo
sinto no meu corazòn,
como ferrado punzón,
como aguzado cuitelo." (14)


     Em "Muitas veces nos matos nativos", a contemplaçom do passo das aves no crepúsculo desencadea outra vez essa tensom do sonhador que fuge de um tempo inseguro. A capacidade de introspecçom do poeta opera sempre perante a contemplaçom dos elementos referidos:

"Muitas veces nos matos nativos,
No crepúsculo fusco e calado,
S'escuita das aves,
O rápido paso;
Das aves aquelas,
Do pico tamaño,
Que sóon retirarse
Dos rudos traballos,
D'escollos e prayas
De fero Oceáno;
E van en ringleira,
Gritando e voando;
En demanda das illas Sisárgas,
Seu noto repara."
                    (Queixumes..., p. 15)


     Do mesmo modo que a paisagem, as cores exercem qualquer funçom simbólica, e isto é umha constante em toda a poesia da segunda metade do século XIX. Som associadas ao crepúsculo as cores moradas e violáceas. Porém, na poesia de Pondal dominam as tonalidades grises e verdes, próprias da geografia poética e vital que representam.

     No crepúsculo descem as sombras da noite que pressagiam tamém a morte.




A presença da morte e o tema da ausência

     A evocaçom da morte é o grande tema que completa, com o passo do tempo e a caducidade da vida, o roteiro ideal do bardo incomprendido e postergado que, chegando ao fim do caminho, procurará acougo para o seu atormentado ánimo:

"Qu'hai tempo que n'este mundo,
Anda o bardo peregrino,
Deseando chegar ó cabo,
D'un traballo escurecido;
E somente repousar,
Deséa do seu camiño."
                    (Queixumes..., p. 35)


     A morte, entendida como acougo e libertaçom, nom como destruiçom e fim, exprime-se atravês de umha rica simbologia sepulcral —antas, dolmen e lugares afastados— caracterizada polo sublime e grandioso. O bardo pede-lhe ao vale que lhe conceda "asilo" a modo dos celtas. Ele será o seio verdecido no que o poeta jaza, cabo do dolmen antigo. Do mesmo jeito, em "Eu non sei por qué terra..." será-o a gigante sombra misteriosa da antiga e alta selva:

"E cruza acaso un home pasageiro,
E o sepulta, e pranto non lle nega;
Baixo a gigante sombra misteriosa,
D'antiga e alta selva."
                    (Queixumes..., p. 42)


ou o velho pinheiral de Froxám, onde moram o olvido e a soedá:

"Amado dos nobres celtas,
Vello pinar de Froxán;
Os nosos antepasados,
Compañeiros da tua edá,
Non longe de ti repousan,
Mais nunca despertarán;
E os seus sepulcros antigos,
Alumbra ó branco luar."

                    (Queixumes..., p. 76)


     Neste poema, o cenário é completado por umha série de elementos —o cervo, a gralha, o regueiro "de triste lanzal"— recriadores do ambiente melancólico que cinge o sepulcro alumeado por um branco luar.

     É significativo e lógico que o bardo reclame cenário semelhante. A eleiçom de lugares nom freqüentados polo home, esquivos e solenes, sublimes como temos referido, convém-lhe ao carácter nom comum do bardo, errabundo num tempo que o despreza. Por isto, o poeta quer a gándara e as antas, nom o mármore gentil:

"Cando for enterrado
non me dedes a min
brilante sepultura
de mármore xentil.
Sepultaime piadosos
de gandra no confín.
E a modo dos celtas
sepultádeme alí
con unhas rudas antas
que se ergan sobre mín;" (15)


     O mármore, como noutros poemas a vestimenta, é algo mundano e achegado á experiência urbana e comum que o poeta desbota, em benefício do primitivismo simbólico da anta e o aleixamento e a soidade da gándara.

     De forma original e indirecta, o tema da morte é tratado numha série de seis poemas, publicados catro em Queixumes dos pinos: "Das africanas praias veciñas", "Das quentes praias", "Non en presentes" e "Das africanas". O esquema é similar nos seis textos, com ligeiras variantes que nom alteram a estrutura nem a ideia geral:

"Das africanas prayas veciñas,
Como costuman,
Retornarán,
As amabres e doces anduriñas;
e pol-o bardo,
Preguntarán.
Mais os curutos,
En donde os pinos
Quieixárse sóen,
C'o vento soán,
Já sabedores
Dos seus destinos,
Cal quen teme decir esquiva nova,

Nada dirán."
                    (Queixumes..., p. 21)


     O tema que conecta estes poemas com o resto da obra é a ausência do bardo, entendida como a própria morte. As andorinhas retornam ao lar amado, estranhamente morado por gentes hirtas e esquivas e, achando em falta o bardo ausente, perguntam aos curutos e ás brisas, sabedoras do duro caso. O sentido completo cumpriria obtê-lo tomando os seis textos como unha unidade e achegando a um único poema todas as variantes possíveis.

     A cárrega emotiva dos poemas, além da mesma ausência —morte—, é intensa. Soidades, púngidas lembranças, brisas que suspiram nas cordas de ferro. Toda a simbologia pondaliá do sofrimento e da melancolia está presente, enriquecendo os textos de forma considerável.
     A morte do bardo é-nos referida de maneira indirecta numha sorte de deslocamento do ponto de vista, controlado pola própria voz poética:

"Da Barra as brisas,
Que no pendido,
Deixado fórmide,
Repousarán;
Con un profundo,
Longo gemido,
Suspirando nas cordas de ferro,
Responderán."
                    (Queixumes..., p. 196)

"Mais os curutos
co abismo, a cova,
que contempraran
o rudo afán,
como quern teme
con bágoas decir esquiva nova,
do duro caso
non falarán." (16)


     O duro caso do que nom falarám os corutos refere-nos, como é óbvio, a morte do poeta. Mesmo as sensaçons emotivas —"profundo e longo gemido", "bágoas"— exprimem de forma clara a dor do pasamento.

     Noutros poemas utilizará-se a voz humana como referente:

"Que diga ó mariñeiro,
Rudo fillo de Osmo,
Ó entrar pol-a Barra,
Volvendo o escuro rostro:
Alí jaz o que forá,
N'outro tempo cantor do eido noso
."
                    (Queixumes..., p. 147)


     Tamém em "A hora en q'o doce luceiro":

"E cando o fillo dos celtas,
No tempo que está por vir,
Pensativo camiñante,
Pase quezáis por aquí;
Cando no tempo en que gia,
Se vexa a luna lucir,
Dirá ó verte desde longe:
O valiente Brandomil,
Saído da gentil e boa raza
Dos celtas, repousa alí."
                    (Queixumes..., p. 83)


     Esta forma de referir desde outro ángulo a morte do bardo implica tamém a intençom de que este seja recordado além da sua vida. O qual entronca directamente com o sentido profético e visionário da obra de Pondal. A este respeito temos indicado noutro lugar que "se a obra de Eduardo Pondal está fortemente projectada cara o futuro, se o poeta é redentor do seu povo, tenderá á inmortalidade. Este sentido da trascendência aparece de forma constante na sua obra. A morte nom será esquecimento, senom que nela mesma cobrará o significado profético." (17)










1 FREUD, Sigmund, "Trader und Melancholie", in Obras Completas, tomo IV, traduçom espanhola, Biblioteca Nueva Ed. Madrid, 1972, p. 2091.
2 LANDEIRA, Ricardo, La Saudade en el Renacimiento de la literatura Gallega, Galaxia, Vigo, 1970, pp. 109-138.
3 VARELA, José Luis, Poesía y restauración cultural de Galicia en el siglo XIX, Gredos, Madrid, 1958.
4 CARBALLO CALERO, R., Historia da Literatura Galega Contemporánea, Galaxia, Vigo, 1975.
5 CARBALLO CALERO, R., op. cit., p. 271.
6 PONDAL, Eduardo, Queixumes dos pinos, Latorre y Martínez Editores, "Biblioteca Gallega", A Corunha, 1886, p. 200. Todos os textos de Queixumes... serám citados por esta ediçom.
7 PONDAL, Eduardo, Novos Poemas, Limiar, transcrición e notas de Amado Ricón, Galaxia, Vigo, 1971, p. 58. Cito por esta ediçom todos os textos pertenencentes a Novos Poemas.
8 LANDEIRA, Ricardo, op. cit., p. 137.
9 PONDAL, Eduardo, Queixumes dos pinos e outros poemas. Ed. Castrelos, Vigo, 2º ed., p. 164.
10 CARBALLO CALERO, R., op. cit., p. 283. Di textualmente: "Non fai poesía paisaxística (...) Achamos, por exemplo, unha visión crepuscular de terras de ribeira; pero inmediatamente se nos revela a calidade simbólica da descripción, que non era un fin en sí mesma (...) Pero nunca perde de vista o carácter auxiliar da natureza bosquexada, que é só ornamento ou estribo do seu canto moral".
11 PONDAL, Eduardo, Queixumes dos pinos e outros poemas, op. cit. p. 186.
12 Ibidem.
13 Ibid., p. 200.
14 Ibid. p. 144.
15 Ibid., p. 164
16 Ibid., p. 203.
17 "O símbolo do cisne na poesia de Eduardo Pondal", in AGÁLIA. Revista da Associaçom Galega da Língua, nº 5, A Corunha, 1986, p. 29.



 

 

 


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