Contos do Outono

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Na procura das moedas perdidas

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Na aldeia tudo funcionava tão normal que se diria da situação que nada tinha mudado desde que o general Decimus Brutus chegara com as

    Na aldeia tudo funcionava tão normal que se diria da situação que nada tinha mudado desde que o general Decimus Brutus chegara com as suas legiões de invasores, algum adianto da nova era, isso sim... Os ruídos dos motores de algum tractor tinham interrompido havia algum tempo o harmonioso concerto do bosque, a sinfonia trocara-se polo brusco, grave e desafinado som da máquina.
    Um miúdo chegou correndo à aldeia, sem alento e sudoroso, anunciava gritando polo reduzido lugar, tão só seis casas plantadas no espaço de uns dez ou doze quilómetros quadrados, que um senhor de longas barbas vinha polo caminho real.
    -Parece o demo! -dizia o miúdo ao final de cada frase.
    O homem ia aproximando-se do lugar donde tinha fugido da guerra e da miséria, no seu cérebro ia recobrando, do passado, a menenice e adolescência. O resto da sua história pessoal pertencia já ao Brasil. Naquela aldeia ele tinha passado fame, frio, calamidades diversas... Mas ele era ali onde deixara o coração enterrado e vinha agora para o desenterrar. Ali arrumados ficaram suas experiências primeiras, seus sonhos de miúdo e rapazolo, arrumados qual um carro numa rua do deserto que é o mundo da grande cidade.
    A duzentos metros da aldeia há um lameiro chamado "O Pradinho"... Nele deteve-se, foi seguindo o rego da água conflitiva que o cruza de lés a lés... As regadeiras alternavam-se de ano em ano. Mas as antigas ainda continuavam deixando-se notar paralelas às actuais. Entre uma destas regadeiras e o próprio rego existe um ângulo de aproximadamente cinqüenta graus... Naquele espaço ele perdera as primeiras moedas ganhadas dos familiares no dia da festa da paróquia... Que desgosto tão grande! Ainda hoje é que ali estava de novo à procura das moedas! Não, não era seu valor o que buscava... Era outro valor, não o que os bancos do capital oferecem, senão o valor de serem as primeiras peças acunhadas que ele possuíra! E fazia tantos anos! Mas ainda lembrou o lugar exacto, a regadeira exacta, o espaço concreto...
    -Depois de tantos anos, parece mentira. De novo contemplando esse reduzido lugar, tão pequeno e que não achei, jamais umas moedas nele ciscadas!? -cavilou assinalando com o dedo.
    A gente naquela hora agrupava-se à entrada do lugar e olhavam com estranheza ao sujeito que caminhava devagar polo "Pradinho".
    -Olha lá! Pepinho -diziam-lhe ao dono do "Pradinho"- deve querer comprar-che o lameiro!
    -Não está à venda -ria o dono.
    -Já vem para cá. Parece um mendigo!
    -Sim... Apenas uma mala de madeira. Lembra-me os anos da guerra! -disse um vizinho maior.
    Ele vestia roupa velha, mas limpa. Os vizinhos quando o olharam de perto não acreditavam. Miravam para o velho e logo dirigiam as olhadas ao dono do "Pradinho". A este ia-se-lhe pondo o rosto vermelho de vergonha. Era o "brasileiro" que chegava. O tio mais jovem do dono do lameiro, Tinha-se dito muito da enorme fortuna daquele extravagante sujeito. Famosas no lugar eram as aventuras dele na sua nenez...
    Quando chegou junto da gente que o aguardava à entrada da aldeia ficou imóvil durante um bom espaço de tempo. Ninguém queria ser o primeiro em romper o silêncio, os mais velhos reconheceram aginha o barbudo e mal vestido indivíduo. Os mais jovens aguardavam resposta àquela estranha cena.
    Ele foi quem afinal falou dos presentes. Comprimentou-os com humildade e recriminou polo pouco afecto demonstrado ante a sua falta de fortuna. Alguns dos presentes negaram essa acusação, outros depois de o comprimentar fugiram como quem o fai da peste. Os mais amigos, aqueles que ainda lembravam a sua genialidade juvenil falaram algum tempo com ele. Depois de abraçar o sobrinho, encaminhou para a humilde morada deste.
    O sobrinho perguntou-lhe polo seu interesse no "Pradinho", ele contou brevemente a história das moedas e abrindo a mão esquerda ensinou-lhe o resultado.
    -Depois de tantos anos encontrou-as, por fim!?
    -Certo. O pior é-che que isto é toda a minha fortuna...
    O sobrinho, com cara de circunstância, lamentou-se, mas ofereceu-lhe a casa para viver nela o resto dos seus dias.
    -Obrigado, homem. Venho de visitar meus irmãos e nengum me ofereceu nada quando souberam da minha ruína.
    O sobrinho, a mulher deste e os filhos são já os únicos habitantes da casa onde o "brasileiro" nasceu há tantos anos que já esqueceu.
    As chuvas do inverno voltaram a cair e os vizinhos já não falavam do "brasileiro", os pássaros emigradores fugiram e as necessidades do sobrinho do "brasileiro" e sua família continuavam sendo as mesmas. Foi quando um dia o velho enviou razão a um taxista de outra aldeia próxima para que passasse a procurá-lo... Agora o caminho antigo, polo que os romanos tinham transportado a prata, estava transitável por carrinhos de turismo. O "brasileiro" ainda tinha mais uma "carta" escondida.
    Num hotel da vila mais próxima havia uma "suite " alugada onde guardava as melhores roupas, documentos, cadernetas de poupança onde ele trespassara a sua fortuna em dólares e títulos de propriedades no país de procedência. Era o prémio ao sobrinho pobre, bondadoso e resignado que o acolhera ainda sabendo da sua aparente ruinosa situação.




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